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Estamos sempre a tempo de Flo(rir)

Desenvolvimento Pessoal & Educação

Estamos sempre a tempo de Flo(rir)

Desenvolvimento Pessoal & Educação

23
Abr22

Ensinar a Pensar (III)

Educação

Na sequência dos posts anteriores, Ensinar a Pensar (I) e Ensinar a Pensar (II) vamos hoje avançar para uma abordagem prática dirigida aos adolescentes.

Aprender a pensar é um processo de desenvolvimento que se adquire de forma progressiva ao longo dos anos. Exigir aos nossos jovens que o façam eficazmente quando, em criança, lhes resolvemos todos os seus pequenos desafios de criança, é esperar colher batatas quando plantámos cebolas. Quando são pequenos é-nos mais fácil e ligeiro dizer-lhes o que fazer, dar-lhes sugestões e indicar-lhes as soluções. Apesar de ser mais rápido e prático, ao fazê-lo, estamos a impedir os nossos filhos e alunos a desenvolverem a habilidade de observarem e sentirem os acontecimentos da sua vida, de refletirem sobre a situação, de tomarem decisões e resolverem os seus dilemas diários. Ou seja, desejamos que eles sejam independentes, mas não investimos seriamente nos alicerces da construção dessa autonomia.

Perguntam, mas pensar não é uma capacidade natural? Sim e não. Sim porque somos seres racionais. Não porque nascemos com o cérebro reptiliano (instintivo) e límbico (emocional) desenvolvido, mas com o neocórtex (racional) em desenvolvimento até ao final da adolescência, idade que se situa cada vez para lá dos 20 anos (parece que nos esquecemos vezes demais deste facto). As crianças e os jovens não têm apurada a capacidade de pensar criticamente sobre as suas próprias vivências, e por isso, não podemos esperar que o façam, simplesmente porque o seu “software” ainda não está pronto.

E a melhor forma de fazer, sem dar sugestões ou soluções, é fazendo BOAS PERGUNTAS, plenas de interesse e curiosidade. Aqui ficam 8 PASSOS para ajudar os jovens a pensar sobre a sua vida e as suas opções:

1) Esclarecer com o jovem qual é seu o objetivo (desejo).

      Exemplos: Para ti, o que é realmente muito importante atingires na vida? O que realmente queres ou desejas? Porque é que isso é importante para ti? Acreditando que tens todas as capacidades e competências, o que queres ter no lugar do que tens agora? Num mundo onde tudo é possível o que queres ter/ser?

2) Perguntar quais as formas ou caminhos que ele vê como possíveis para alcançar o seu objetivo. Fazer uma lista de todas as ideias – tudo é possível!

       Exemplos: Como pensas fazer isso? O que é importante garantir ou fazer para alcançares o teu objetivo? Que competências ou habilidades, se desenvolveres te podem ajudar no teu objetivo? Como podes fazer? Que outras formas serão possíveis? Quais funcionarão melhor neste caso?

3) Perguntar aos colegas, amigos ou pessoas que ele admira, como resolveram ou resolveriam a questão. Fazer uma lista de todas as ideias, sem eliminar nenhuma.

       Exemplos: Conheces alguém que tenha vivido e resolvido este tipo de situação? Que soluções os teus amigos encontraram? Como fizeram? E como é que essas pessoas que consideras “capazes” fariam?

4) Depois de identificadas todas as opções, fazer uma triagem de alternativas e perguntar que caminho quer seguir.

        Exemplo: Perante estas possibilidades o que acreditas que se encaixa melhor em ti/na situação? O que sentes que será melhor para ti? Que desafios poderão surgir ao seguires este ou aquele caminho? Qual queres escolher?

5) Decidido o caminho, perguntar quais são os recursos necessários e que pessoas poderão estar envolvidas (pessoas, materiais, equipamentos, conhecimentos, iniciativas, atitudes, ações).

        Exemplo: Vamos fazer uma pequena lista de que irás precisar para realizar/resolver a situação.

6) Perguntar que riscos e possíveis problemas podem surgir nesse caminho

        Exemplo: Existem obstáculos para lá chegar? Vamos fazer um exercício sobre possíveis problemas que poderás ter de enfrentar …

7) Elaborar um Plano de Ação para eliminar ou minimizar riscos

        Exemplo: O que podes fazer para eliminar esse risco? E este …?

8) Identificar indicadores ou evidências que comprovarão que conseguiu alcançar o objetivo

        Exemplo: Que evidências/provas terás que te dizem que alcançaste/resolveste o problema/situação? O que precisa acontecer para te olhares ao espelho e dizeres: Resolvi!

 

Se queremos criar cidadãos que pensam pela sua própria cabeça, que vão atrás dos seus objetivos e encontram a sua própria solução, precisamos de aprender a AJUDAR AS NOSSAS CRIANÇAS E JOVENS A PENSAR. Neste mundo tecnológico é cada vez mais indispensável criar condições para as nossas crianças e jovens aprenderem a gerir emoções e a pensarem de um modo crítico ... se assim não for, acabaremos por ser instrumentados ... e não quem usa e controla o instrumento!

Mais do que proteger, facilitar e preparar o caminho para as crianças e jovens, temos de mudar o foco, ser mais empáticos e descobrir como poderemos preparar os nossos jovens para o caminho a seguir, seja ele qual for!!

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Fonte: TeenCoaching/ICIJ

 

10
Abr22

Aprender ou não aprender (II)

Educação

Ainda na sequência do que escrevi no post anterior, Aprender ou não aprender (I), sobre AQUILO QUE GOSTARIA DE TER APRENDIDO NA ESCOLA ou daquilo que me parece que seria útil que a escola ensinasse … tenho algo mais que me parece oportuno partilhar …

Ninguém dúvida: a nossa mentalidade, o nosso modo de ver o mundo, os nossos valores, as nossas crenças e convicções são-nos instaladas desde a mais tenra idade. Em casa, na escola, na televisão, na internet … na sociedade. Sem darmos por isso somos “programados” para pensar de determinada forma, para acreditar em determinados princípios e para não contestar o modus operandi à nossa volta. Sejamos sinceros – é essa a principal função da educação e a principal (e legítima) preocupação parental – criar e formar cidadãos inseridos, adaptados e úteis à sociedade.

Por isso, muito daquilo que hoje somos resulta das nossas vivências infantis e juvenis. É natural, é mesmo assim. Nascemos com o “hardware” pronto, mas o “software” vai sendo instalado e reinstalado ao longo de toda a nossa vida. Como é que isso acontece? Através da mediação humana e desde o nascimento. Neste processo a interação pessoal é essencial.

E se assim é, como seria, se em vez de desvalorizarmos sentimentos (“Isso já passa!”), de apontarmos erros (“Isso não se faz!”), de atribuirmos culpas (“Estou farta de te dizer sempre a mesma coisa!”), de punirmos ou castigarmos (“Ficas sem telemóvel para pensares no que fizeste!”) … nos atrevêssemos a quebrar o padrão educativo e, desde cedo, instalássemos CRENÇAS POSITIVAS no “software mental” das nossas crianças?

Como teria sido a nossa vida, se em criança nos tivessem sido transmitidas premissas e convicções que nos permitissem acreditar que temos em nós todos os recursos que precisamos para criar a vida que desejamos viver?

Sabendo que pensamento gera comportamento, como seria se a escola/família valorizasse o ensino das denominadas as soft skills (competências pessoais e interpessoais), a partir da transmissão e reforço ativo e coerente dos seguintes PENSAMENTOS POSITIVOS:

  • EU SOU CAPAZ - Sou “capaz de” de ver, fazer, ser … com clareza, estratégia e persistência.
  • EU SOU IMPORTANTE! EU PERTENÇO A … Eu colaboro e contribuo mais quando me sinto parte de … e quando sinto que sou envolvido e verdadeiramente escutado.
  • EU TENHO O PODER! EU POSSO … é fazendo que aprendo a fazer e sobretudo a ser. Quando decido e aplico o que decidi, aprendo cada vez mais a resolver problemas.
  • Eu consigo. Eu sou suficiente – é a base da minha autoconfiança e autoestima. Um passo de cada vez e está tudo bem. Hoje sou melhor que ontem e por isso, o meu melhor é sempre mais um passo no caminho.
  • Tenho sempre escolha – opto por tudo aquilo que for melhor para mim e aumentar as minhas possibilidades.
  • Tenho o poder de mudar a realidade - a realidade muda quando olho de outro ponto de vista e quando mudo a minha atitude perante a situação.
  • Tenho o poder de criar a minha própria realidade - posso escolher o que pensar e os meus pensamentos irão criar os meus resultados.
    Por ação ou por inação, todos somos criadores da nossa própria realidade.
  • Foco-me sempre no que quero realizar – e não no que não quero, porque irei receber de volta aquilo em que me focar.
  • Estabeleço prioridades e faço escolhas intencionais - Princípio de Pareto - 80% dos resultados que consigo vêm apenas de 20% das minhas atividades. Aplico o meu tempo naquilo que tiver um maior retorno positivo para mim.
  • Todas as experiências trazem oportunidades - existe sempre uma oportunidade de crescimento por trás de cada obstáculo ou contrariedade. Procuro sempre a bênção escondida de cada desafio!
  • Erros são oportunidades de aprendizagem – o erro é uma mensagem que indica e orienta o caminho. Os falhanços podem conter excelentes aprendizagens. Não desistir, apesar de erros e falhas, é o mais importante.  Os erros dizem-me:  Não é por aí! Não desistas. Estás cada vez mais perto.
  • Opinião é interpretação - As nossas palavras são somente representações dos acontecimentos ou das situações que descrevemos – não são a realidade/verdade em si. O mapa não é o território!!
  • Não levo as coisas demasiado a sério – 80 a 90% das minhas preocupações e receios nunca se irão concretizar. Ups!! 
  • As pessoas não são o seu comportamento - lido com o seu comportamento e aceito a pessoa por trás do comportamento. Não levo a peito ofensas porque os comportamentos são passageiros e as pessoas são permanentes!
  • O medo é meu aliado – o medo avisa-me e prepara-me para algo importante que vai acontecer, mas não me deve bloquear! Presto mais atenção aos detalhes, preparo-me ainda melhor e avanço com coragem!
  • Não me comparo com os outros - a comparação com os outros conduz à insatisfação. Só a comparação comigo mesmo, de onde vim, o que já consegui e como cresci … me dará poder pessoal, motivação e tranquilidade. Eu não tenho comparação!!
  • As pessoas têm todos os recursos de que necessitam para ter sucesso - não há pessoas sem recursos, há pessoas que não sabem ou conseguem usar os seus recursos pessoais. Descubro as minhas próprias qualidades escondidas e uso-as como sendo únicas e especiais.
  • Todo o comportamento tem uma intenção positiva – a intenção é sempre boa, mas o comportamento pode ser desajustado.
    Mantenho a intenção e adapto o meu comportamento para obter o resultado que desejo.
  • Juntos somos mais fortes - Não chegamos a lado nenhum sozinhos: Somos seres sociais e o verdadeiro sucesso está no trabalho em equipa. Ninguém ganha sozinho! Eu ganho porque tu ganhas (e não porque tu perdes). Sozinhos podemos ir mais rápido. Juntos vamos mais longe!
  • A empatia faz magia – não há comunicação sem conexão. Todos temos muito a prender uns com os outros. Aproximo-me, olho as pessoas nos olhos e escuto com genuína curiosidade e interesse.
  • Não reajas, age – não espero, assumo a liderança, tenho a iniciativa, sou pró-ativo na busca daquilo que quero, ajusto a situação com a minha própria ação. Dou primeiro, recebo depois. Não espero que escolham ou façam por mim, senão vou (des)esperar.
  • As coisas são como são – não é o que me acontece que me define, mas aquilo que faço com aquilo que me acontece. Sem resignação e com determinação, o que posso/vou fazer com isso?
  • A gratidão é contagiosa – facilita-me o foco nas coisas positivas da vida e atrai para mim estados de confiança e felicidade.

 

Estes 23 poderosos ensinamentos ter-nos-iam dado jeito se tivessem sido instalados no nosso “software” desde criança. Estaríamos hoje mais bem apetrechados no que diz respeito às nossas Soft skills e certamente estaríamos mais bem preparados para os desafios que a vida nos trouxe.

Não basta desvalorizar as crenças limitadoras das crianças ou dizer-lhes que são capazes ou que são importantes. É imprescindível cuidar da coerência entre palavras e atos, bem como preencher o espaço com pensamentos positivos. Serve-te deste “Menu de Pensamentos Positivos”, escolhe um … e começa por aí. Começa por aquele que se adequar melhor às caraterísticas de personalidade do teu filho/aluno e instala-o com amor, persistência e paciência.

Fica, no entanto, uma advertência. Os pequenos só irão acreditar se tu mesmo acreditares. Não chega dizer. Diria mesmo, não chega acreditar. É preciso fazer. É preciso sentir, praticar, dar o exemplo, vivenciar. Só assim o download será bem-sucedido!!

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06
Mar22

Quando nos falta a luz

Educação

Temos um país cheio de sol, um excelente clima, uma luz admirável, uma natureza agradável e diversificada … e no entanto, na escola, vejo salas às escuras, persianas corridas, luz artificial ligada, olhos num quadro interativo horas a fio, algumas mochilas em cima da mesa, cabeças deitadas nos braços …  e, claro, um grande desapego pela aprendizagem e uma enorme dificuldade em gerir positivamente emoções e relacionamentos. O perfil da geração de hoje não me tranquiliza, preocupa-me. Não por aquilo que lhe podemos criticar, mas por aquilo que NÃO ESTAMOS a fazer por ela.

Somos aquilo que fazemos de forma repetida. Os nossos hábitos formatam o nosso cérebro, instalam formas de pensar e de sentir, criam caminhos neurológicos que nos trazem rotinas e formam a nossa personalidade. Se é assim connosco (adultos), imaginem como será no caso das crianças e jovens, ainda em fase de maturação cerebral. É isso mesmo, é tempo de parar, olhar e refletir, o que estamos a fazer às nossas crianças e jovens?

Passamos demasiado tempo com os olhos nos ecrãs, a fechar a janela para ver melhor a televisão, o quadro interativo, o pc ou telemóvel … é uma escuridão que se instala, horizontes que se reduzem, a vida que anoitece.

Para além dos efeitos diretos e nefastos do uso excessivo de dispositivos digitais recreativos no desenvolvimento infantil e juvenil – alteram o desenvolvimento do cérebro, reduzem a inteligência, afetam o desenvolvimento cognitivo e a capacidade de reflexão, prejudicam a saúde, promovem a obesidade, dificultam o sono, etc. – e dos seus efeitos colaterais de roubarem uma imensidão de tempo (que não pode ser recuperado) a outras atividades indispensavelmente alicerçadas na interação humana e no progresso da linguagem, acresce ainda a enorme tendência para se passar muitas horas do dia com níveis reduzidos de luz natural ou mesmo às escuras.

A luz natural é indispensável ao bom funcionamento do organismo humano, pois, do ponto de vista da saúde física e mental, estimula a produção de serotonina, dopamina e melatonina, hormonas responsáveis pelo bom humor, regulação do ciclo do sono, apetite, energia e motivação. Ou seja, o Sol é o nosso melhor “remédio”.

Tentando fundamentar esta minha preocupação, referem estudos científicos que, os estudantes que têm aulas em salas onde entra muita luz do dia têm melhor rendimento do que aqueles que aprendem com luz artificial. Um estudo realizado nos EUA comparou os resultados dos testes de 21 mil alunos e concluiu que basta haver janelas grandes para a progressão e os resultados escolares serem significativamente melhores.  

Neste sentido e no que diz respeito à aprendizagem, a luz do dia funciona como um agente facilitador, não só através da clareza da visão, mas sobretudo através dum bem-estar geral, de um estado desperto e de uma predisposição natural para a aprendizagem, bem como, indiretamente, providenciando fatores de saúde física e mental de alunos e professores.

Para relembrar, a luz do SOL …

MELHORA O HUMOR - O Sol afeta as emoções. A mudança no nível de luminosidade altera a química cerebral e influencia o nosso equilíbrio emocional. E a aprendizagem só acontece quando estamos emocionalmente disponíveis para aprender. Logo, a luz solar afeta diretamente a aprendizagem.

REGULA O SONO - A melatonina, hormona que regula os ciclos do sono é ativada pela alternância entre a luz solar e a falta dela, o que é essencial para o bom funcionamento da digestão, do estado de vigília, do sono, da regulação das células e da temperatura corporal. Ninguém aprende num estado fisiológico de descanso ou sonolento.

FUNCIONAMENTO DO CÉREBRO – A luz do Sol interfere com a circulação cerebral e a falta de vitamina D proveniente da luz solar pode afetar processos cognitivos, tais como capacidade de raciocínio e concentração, memória, retenção de novas informações, etc. Não existirá aprendizagem de qualidade sem uma otimização do funcionamento neurológico e cerebral.

PREVINE A BAIXA VISÃO – Em todo o mundo têm crescido problemas de visão nas crianças, o que se acredita estar relacionado com o uso excessivo de tecnologia e a consequente exposição à luz azul dos ecrãs, mas também com a falta de exposição à luz solar. Para além de outros benefícios, as atividades ao ar livre também exercem um papel importante no desenvolvimento e proteção da capacidade visual das crianças e jovens.

Em salas de aula escuras, a capacidade de atenção dos alunos tem tendência a diminuir, bem como o cansaço, a sonolência, as dores de cabeça e a irritabilidade nos olhos têm tendência a aumentar. Por este motivo, é essencial que não adormeçamos sobre este assunto e que estejamos atentos à luz das nossas salas escolares – as crianças e jovens passam horas e horas sentados, muitas vezes às escuras, o que contraria o principal alicerce do desenvolvimento humano – luz, movimento e alimento. Sem isso, não há nem nunca haverá espaço para a aprendizagem!

Afaste as cortinas, levante as persianas e abra as janelas. Permita que os raios de sol entrem na sala. Diversifique estratégias e ferramentas. Não se renda aos ecrãs. Saia para a rua, leve as crianças ou jovens a passear a pé, chame-lhes a atenção para os pormenores do caminho, dê aulas no exterior. Mantenha as crianças e os jovens despertos e ativos durante o dia. E sobretudo, não permita, de modo algum, que se mantenham acordados à noite, e muito menos, a olhar um ecrã … nunca!

Somos adultos. Somos os responsáveis pela sua saúde física e mental, mas por vezes damos mais atenção ao aspeto físico do que ao mental, esquecendo-nos que estão diretamente ligados um ao outro.

Queremos resultados, mas nem sempre cuidamos dos fatores que os potenciam. Primeiro precisamos de cuidar de quem aprende, criando as condições para que, mais tarde, apareçam os resultados …

Resultados que hoje exigimos, mas não salvaguardámos.

Que a luz não nos falte e ilumine a nossa capacidade de observar e intervir junto desta geração que tento precisa de nós. Não adormeçamos nós também!!

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28
Fev22

Comunicar com os filhos de forma positiva e eficaz

Educação

As intenções dos pais são sempre as melhores – ajudar os seus filhos a serem resilientes e a superarem desafios. Acreditamos que se formos duros com eles, eles ficarão mais bem preparados para a dureza da vida. E por isso, não os poupamos a críticas, aos nossos dedos apontados e aos nossos tons austeros e elevados. Naturalmente e de forma quase automática e tantas vezes inconsciente, tendemos a repetir o padrão daquilo que os nossos pais fizeram connosco … se funcionou connosco, certamente irá funcionar com eles também.

Se reativarmos as nossas memórias de infância, facilmente nos lembraremos que quando os adultos criticam uma criança, o que acontece, é que ela não deixa de os amar, mas deixa principalmente de se amar a si mesma. Por se encontrar ainda numa fase autocentrada de desenvolvimento, vira os seus sentimentos contra si própria e a sua autoestima fica seriamente afetada, deixando marcas para a vida adulta (isto não será certamente surpresa para nós, adultos, crianças de outrora, que cresceram a acreditar que não têm valor ou que não são suficientes).

Assistimos hoje a uma geração mergulhada num medo crescente de falhar e de ser criticada – preferem não arriscar, não fazer, deixar em branco, ficar calados, desistir, não tentar … do que correr o risco de serem criticados ou de não corresponderem àquele estereótipo de perfeição que eles próprios idealizam (no caso dos adolescentes, este efeito é exponenciado pela vivência paralela em redes sociais). Tolhidos por um mecanismo de comparação com os elevados padrões da comunicação e dos “mídia”, parecem bloqueados dentro do colete de forças que eles próprios criaram. Com uma pandemia à mistura, de um modo geral, estão a viver profundas dificuldades na gestão das suas emoções, entrando facilmente estados mais ansiosos ou agressivos. Esta geração necessita muito mais do apoio dos adultos do que nós alguma vez precisámos. Como os poderemos ajudar?

Em primeiro lugar, precisamos libertar-nos do nosso inimigo nº1: o nosso crítico interno, que vive em nós desde criança. Sim, já não precisamos dele. Já não somos crianças dependentes dos pais e por isso carentes de amor e aceitação.  Somos adultos, livres e autónomos, conscientes que o nosso autocuidado, autorrespeito e autovalorização interfere diretamente nas nossas relações. Somos por isso responsáveis por quebrar o padrão e não passar aos nossos filhos a mesma energia, limitadora e sabotadora do seu potencial. Só adultos equilibrados podem equilibrar crianças. Por eles e também por nós, precisamos desenvolver estratégias para nos mantermos calmos e equilibrados.

Depois, em segundo lugar, precisamos cuidar da nossa comunicação com as nossas crianças. O que nos leva a levantar o tom, a usar sarcasmo ou cinismo, a apontar o dedo, a recorrer à ameaça e a gritar? A nossa própria frustração de não conseguir controlar a situação. Só que, ao queremos controlar a situação, a criança cresce a aprender que as situações são para dominar e vai querer também controlar as situações da sua vida da mesma forma que fazem consigo. E jogo não pára, a não ser que o adulto pare! Todos podemos ter momentos de descontrolo, mas essa não pode ser a regra nem o princípio. Errámos? Voltamos atrás e recomeçamos. Pedir desculpa e assumir a responsabilidade dos nossos atos será um bom exemplo para que as crianças se permitam também errar (eles precisam tanto desse exemplo) e encontrar soluções mais positivas e benéficas. O foco positivo, o tom e a forma acolhedora da nossa comunicação é essencial, pois neste momento, muitos dos nossos jovens vivenciam um discurso interno bastante autocrítico e limitador.

Por terem o seu cérebro ainda em desenvolvimento, as crianças são muito mais afetadas por uma comunicação crítica e hostil. Sob pressão e ameaça, sentem medo e insegurança, desenvolvem uma maior tendência para a depressão ou para a agressão, e inevitavelmente, terão uma maior propensão para repetir o padrão parental. Assim sendo, o mais provável resultado dos nossos gritos e discussões, será que as crianças vão pensar que gritar é normal, que é a forma como se resolvem problemas e, naturalmente, vão também começar a gritar e a discutir connosco. Com a continuidade, o cérebro irá entrar em modo defensivo, ativar o seu sistema de sobrevivência, tornar-se imune aos gritos, e consequentemente, deixarão de nos ouvir. E aí ficarão entregues ao seu discurso interno, à comparação com padrões exagerados de perfeição e à troca de comentários entre pares, o que certamente lhes proporcionará altos índices de insatisfação e de desmotivação pessoal. 

Em alternativa, COMUNICAR COM OS FILHOS DE UMA FORMA POSITIVA E EFICAZ, pode passar por:

  • Estar num estado emocional calmo, próximo (olho no olho) e conectado com a criança/jovem.
  • Validar sentimentos e reconhecer a importância da situação – “Vejo que estás … / é importante para ti”. 
  • Entregar-se ao momento com tempo, dedicação e seriedade, questionando em tom curioso e empático, sempre focado numa solução positiva. 
  • Cuidar do tom e da forma das palavras – não responder no mesmo tom nem dizer nada que não gostaria de ouvir.
  • Impor limites com afeto e respeito, sem ofender ou humilhar.
  • Dizer o que se quer que a criança faça e não o que não se quer – dar instruções simples, curtas, diretas e positivas.
  • Reduzir o número de sugestões e ordens, oferecendo espaço para alguma liberdade de escolha e decisão.
  • Dizer SIM (não dizer tantas vezes a palavra NÃO), procurando dar alternativas positivas dentro de determinados limites.
  • Repetir sempre que a criança não tenha ouvido ou percebido.
  • Estabelecer regras e acordos, que considerem as necessidades de todos, e confiar no resultado, dando tempo para que o combinado seja cumprido pela criança ou jovem.
  • Avisar previamente que está a chegar o momento de cumprir um acordo ou ação (ex: 5 ou 10’ antes).
  • Elogiar sempre que o combinado é cumprido, valorizando o processo e as qualidades/habilidades passíveis de desenvolvimento, e não outros atributos inatos e imutáveis.
  • Reconhecer e pedir desculpa quando erramos e perdemos a paciência. Dar tempo para que ambos voltem à calma.

Pode parecer muita coisa ao mesmo tempo, mas trata-se de um modo de estar que se vai cultivando a pouco e pouco. Em doses homeopáticas, hoje um pormenor, amanhã mais outro, porque a educação é aquilo que fazemos repetidamente.

Numa altura em que as crianças e os jovens tanto precisam da nossa ajuda, cuidar da nossa comunicação é cuidar da saúde mental e emocional dos nossos filhos, é quebrar o padrão, criar uma relação mais saudável e investir no futuro. Pais que escutam e interagem positivamente com os filhos tendem a ter filhos que, mais tarde, na adolescência também escutam e interagem com os pais.

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04
Jan22

Aprender ou não aprender (I)

O que eu gostava que a escola ensinasse

Costumo dizer que sou daqueles alunos que nunca mais saem da escola … iniciei aos 5 anos e nunca mais de lá saí … é muito ano (nem vos digo quantos!). A escola é a história da minha vida. Primeiro foi a aprendizagem. Depois o ensino. É cada vez menos a escola do ensino-aprendizagem e mais da aprendizagem-ensino …, pois “ninguém é tão grande que não possa aprender, nem tão pequeno que não possa ensinar” (Esopo).

Constato que, em contexto escolar, se vai acentuando cada vez mais o hiato entre o ensino e a aprendizagem. É imperioso dar a matéria, cumprir o programa, concretizar o planeamento e assinar sumários. É preciso “dar” a lição sem muitas vezes se confirmar se aquilo que se transmitiu foi “recebido” compreendido, assimilado e integrado. E assim o ensino se divorcia cada vez mais da aprendizagem, sem se percecionar que a escola é prioritariamente um lugar de aprendizagem e não tanto de ensino. De que serve ensinar se os alunos não aprendem aquilo que ensinamos?

Na faculdade aprendi que para além do curriculum formal (programa), deveria também ser considerado o currículo verdadeiramente aplicado e curriculum oculto (implícito). Nos dias de hoje, pela sua importância e relevância, uma nova manifestação do curriculum se vem impondo – o CURRICULUM PARALELO - o currículo online, da internet, da conexão com redes sociais e aplicações recreativas. Parece-me que, cada vez mais, pela sua constância e repetição (somos aquilo que fazemos de forma repetida!), existe uma grande tendência para que este tipo de currículo seja estruturante do desenvolvimento infantil e juvenil, correndo o risco do seu impacto superar a influência parental ou escolar.

Mais do que memorizar conhecimento (disponível na internet) é urgente desenvolver capacidades e competências de pensamento crítico e de liderança pessoal, de acesso e pesquisa de informação, de análise e tomada duma decisão deliberada e responsável. Mais do que conteúdos é urgente trabalhar processos, ou seja, não basta dar o “peixe” e já nem sequer basta dar a “cana de pesca” (eles já têm tudo na mão!). É preciso ENSINAR A PESCAR (ou a pensar). Além dos dedos, é preciso aprender a “usar a cabeça”. É preciso aprender a regular emoções. É preciso descobrir aquilo que se quer e depois COMO fazer para lá se chegar. É preciso aprender como usar os recursos (tantos) a nosso favor, PASSO A PASSO …

Olhando a escola, e considerando a força do sistema, tenhamos a coragem de questionar e honestamente responder: O que verdadeiramente a ESCOLA ensina às nossas crianças?

A partir daquilo que observo no dia-dia escolar e da tendência comportamental dos nossos alunos ao longo da sua deambulação pelos vários anos de escolaridade, no meu entender, estas são as 5  lições mais fraturantes:

  1. A verdade vem da autoridade (os alunos não se sentem ouvidos nem representados na maioria das decisões).
  2. A inteligência é a capacidade de recordar e repetir da forma esperada e no exato momento em que é solicitado (sem preocupação de aplicabilidade posterior).
  3. Uma boa memória e a repetição acrítica são recompensadas (ter opinião diferente é cada vez mais arriscado).
  4. O não-cumprimento é unidirecionalmente punido (sem apelo).
  5. O conformismo intelectual e social é requerido e gratificado.

 

Assim é hoje, tal como foi comigo há 40/50 anos atrás. E o que se passou comigo? Levei anos, décadas a DESAPRENDER o que aprendi na escola, a mudar crenças, a abrir-me a outras possibilidades, a confiar mais em mim e nas minhas capacidades, a reencontrar a criatividade e o meu próprio valor … a descobrir a verdadeira pessoa por trás daquela couraça. E contigo, como foi?

A escola deveria educar, preparar, potenciar, desenvolver capacidades, dons e talentos. Devia EDUCAR PELA POSITIVA e não se assistir àquele constante “deita a abaixo” (com as devidas exceções) que nos marca para toda a vida. Deveria levar ao autoconhecimento, à apreciação das qualidades únicas e especiais de cada um, ao reforço dum caminho de desenvolvimento e dum projeto pessoal … sim, desde pequeno, preparando para a vida e para as exigências dos tempos que vivemos … e será que verdadeiramente o faz? E se o fizesse, a escola não seria um lugar bem mais interessante?

Com um currículo longo e desinteressante, o distanciamento das aprendizagens da prática do dia-a-dia é uma das grandes razões pela qual os alunos afirmam gostar da escola (como meio de socialização entre pares), mas não das aulas. É assim há décadas. “A escola é uma seca”. A escola continua uma seca …

Com uma escola pouco apelativa e com os pais mais distantes e distraídos com outras "prioridades", vêm-me à ideia matérias de manifesta utilidade (habilidades básicas de vida) a serem abordadas e aprendidas ao longo dos vários anos de escolaridade:

  • Inteligência Emocional (coerência entre pensamento-sentimento-comportamento, empatia)
  • Autodeterminação (identificar o seu propósito /objetivos pessoais, estabelecer o seu caminho e criar a sua própria realidade/condição de vida, única e autêntica)
  • Autocuidado (saúde física e mental, sono, nutrição, auto valor, autoconfiança, gestão do stress)
  • Valores e Relações Interpessoais Saudáveis (interdependência pessoal nos diversos contextos sociais - como desenvolver relações win-win)
  • Resolução de Problemas (pensamento crítico, pesquisa e análise de informação, busca de soluções)
  • Criatividade e Inovação (valorizar e desenvolver a intuição e arriscar algo diferente)
  • Comunicação (como ajustar a comunicação ao outro, como falar em público)
  • Inteligência Financeira (economia pessoal)

A aprendizagem de habilidades socio-emocionais certamente aproximaria a escola da vida real e dotaria os alunos de recursos e ferramentas pessoais que os preparariam melhor para os desafios que irão enfrentar na sua vida pós-escolar. Conhecimento é uma coisa. Conhecimento colocado em prática … é outra. Conhecimento colocado em prática de forma adequada às exigências da sociedade do século XXI … é ainda outra.

Na minha visão, o futuro (diria o presente) da escola passa pela nossa capacidade de criar um lugar emocionalmente seguro que valorize a autoexpressão individual. Um lugar de acolhimento e validação pessoal, em que o aluno (ou o professor), antes de o ser … é pessoa, com dons, talentos, dúvidas, fracassos e hesitações. Um lugar de autodescoberta, em que a aprendizagem cognitiva se alicerça em emoções positivas e em que a autorresponsabilidade, autoconfiança e autodeterminação consolidam a formação pessoal/profissional e o sucesso do percurso escolar. Um lugar de suporte mútuo, em que os ganhos de uns são os ganhos de todos, em que a cooperação supera a competição, em que o potencial de entrada se transformou em reais capacidades à saída.

Sonho com um lugar de CONHECIMENTO COLOCADO EM AÇÃO, de forma positiva, empática, respeitadora, construtiva e ecológica. Uma escola onde todos e cada um tem espaço para ser, para saber e fazer, para se expressar e errar, para se descobrir e verdadeiramente APRENDER a ser feliz!

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31
Out21

Ensinar a pensar (I)

Educação

Educar não é ensinar as respostas, educar é ensinar a pensar. – Rubem Alves

Sendo mãe e professora, oiço e afirmo vezes sem conta que as crianças/jovens/alunos de hoje “não sabem pensar” e que preferem as respostas fáceis, imediatas e descartáveis. O mundo acelerou e parece não haver tempo para investir em processos de observação, exploração, descoberta, construção e criação do saber.

Vivemos na era do consumo “usa e deita fora” a quase todos os níveis, incluído a nível do conhecimento … e isso, não só impacta a forma como vivemos o nosso dia-a-dia, como a formação da personalidade e o desenvolvimento do cérebro dos mais jovens, pois se hoje lhes damos a solução “oferecida de bandeja”, mais tarde, na sua vida adulta, dificilmente irão procurar, construir e encontrar novas soluções para problemas antigos.

De um modo geral, hoje percecionamos a realidade e os acontecimentos à nossa volta de uma forma rápida, apressada, logico-racional, e tantas vezes sequestrada pela emoção. Embora a criatividade, a flexibilidade, o empreendedorismo sejam qualidades cada vez mais requeridas no atual mercado de trabalho, temos vindo progressivamente a perder a capacidade e a flexibilidade de pensar de forma espontânea, refletida, crítica e criativa.

Tendencialmente, olhamos mais para os outros do que para nós próprios e queixamo-nos que os jovens de hoje não sabem o que querem, que são desprovidos de objetivos de vida e se deixam andar ao “sabor da corrente”.

Afinal, o que está a faltar? Um cérebro capaz de pensar e de atuar critica e deliberadamente sobre a realidade que enfrenta. Este cérebro é um cérebro que não é refém das suas emoções, que reflete e fala sobre sentimentos, que os identifica e compreende, classifica e usa com curiosidade, abertura e sentido crítico, ampliando possibilidades e criando uma liberdade de ser e de fazer de acordo com a sua intenção e/ou objetivo.

Sabemos isto (teoricamente) e vamos desejando que as nossas crianças saibam pensar, sejam autónomas e autodeterminadas, sem, contudo, mudarmos algo na nossa forma de educar que lhes proporcione essa aprendizagem.

Mas, diriam, pensar não é natural? Não nascemos já com essa habilidade inata? Sim e não. Pensar é humanamente natural. Porém, a vontade de pensar de forma reflexiva precisa ser estimulada e ensinada. Muitas vezes esquecemo-nos deste pequeno “pormaior” e partimos erradamente do princípio de que as nossas crianças já “sabem pensar” e que já têm adquirida essa capacidade reflexiva sobre as situações que vivenciam.

Vais ali para aquele canto pensar sobre o que fizeste!” – sabem o que acontece verdadeiramente naquele canto?

A criança sente-se incompreendida e não percebe porque está ali, pode sentir-se rejeitada e não-amada, culpa-se e classifica-se como “não suficiente” (conseguem rever-se na vossa infância?). Mas, acima de tudo, quer sobreviver e escapar dali. Está envolta numa espiral de emoções e não consegue refletir sobre a situação, desenvolver um pensamento estruturado, crítico e construtivo sobre o ocorrido. Não obstante, o seu cérebro foi desenhado para sobreviver. Ali, naquele canto, a criança vai aprender a se superar, vai aprender a enterrar emoções, a adaptar-se ao que o adulto quer (porque o que mais deseja é ser amada) e vai encontrar a solução: vai fingir que pensou, vai fingir que entendeu, vai fazer e dizer aquilo que sabe e sente que o adulto quer ouvir … porque o que mais quer é ser aceite e sair dali!

Será que assim ajudamos as crianças a desenvolverem a sua neuroplasticidade cerebral, a gerarem novas sinapses, a criarem novos caminhos neurológicos e novas linhas de pensamento que as prepararão para enfrentarem desafios futuros? Será que assim, realmente, as estamos a ensinar a pensar?

A aprendizagem não é apenas um ato de receção e reprodução. A aprendizagem pressupõe apropriação, interpretação e transformação da informação à sua própria maneira, tornando-a disponível a ser usada com sucesso na sua vida. É um processo … que muitas vezes descuramos, apressamos, desvalorizamos. Afinal, também nós tendemos a ir diretos ao resultado imediato e mais fácil.

Em casa ou na escola, ensinar a pensar começa desde que a criança nasce, começa por a ajudar a pensar sobre as suas emoções, a conviver com elas e a agir sobre elas.

Por isso, ensinar a pensar é também desacelerar e saber esperar.

Ensinar a pensar é saber que cada criança é única e que não há crianças iguais. Todas as crianças são importantes da forma que são, o que sente é importante e o que pensa sobre o que sente também é importante.

Ensinar a pensar é facilitar o processo de descoberta e de experimentação, sem apressar a conclusão.

Ensinar a pensar é estimular a participação e ajudar a clarificar cada passo do processo de reflexão, sem saltar etapas.

Ensinar a pensar é questionar em vez de responder, ouvir em vez de sugerir.

Ensinar a pensar é valorizar as propostas, aceitar as sugestões e promover a argumentação.

Ensinar a pensar é dar largas à imaginação, sonhar e inventar de forma divertida.

Ensinar a pensar é promover o trabalho de colaboração e em equipa, afinal “várias cabeças pensam melhor que uma”.

Ensinar a pensar é estimular o diálogo, procurando e explorando diferentes pontos de vista.

Ensinar a pensar é incentivar a reflexão, a análise antecipada de consequências e a tomada de decisão autodeterminada e segura.

Ensinar a pensar é respeitar o ritmo de aprendizagem de cada criança, ressignificando os erros, auxiliando na gestão da frustração e encorajando a persistência.

Ensinar a pensar é estimular a curiosidade, a criatividade, a vontade de descobrir e o gosto de aprender coisas novas.

Ensinar a pensar é saber que respeitar cada passo do entendimento abre um caminho cerebral que, reforçado, se transforma numa autoestrada de pensamento.

Ensinar a pensar é formar pessoas capazes, responsáveis, autónomas e livres.

Mas para isso não podemos ter pressa, querer que todos aprendam ao mesmo ritmo e da mesma forma, e ter hoje os resultados que naturalmente, só surgirão amanhã.

A educação do século XXI necessita ir além da memorização de conhecimento. Hoje em dia existe tanta informação disponível que a capacidade de pensar criticamente se tornou uma ferramenta indispensável para fazer face aos desafios da sociedade atual. A escola e a família estão atualmente a ser chamadas para exercer um novo papel – ENSINAR A PENSAR.

Ser capaz de recolher informação, analisá-la criticamente, resolver problemas e tomar boas decisões são habilidades essenciais já nos dias de hoje. Quando as nossas crianças forem adultas, e para que possam verdadeiramente ser os protagonistas do papel principal das suas vidas, estas habilidades serão certamente ainda mais requeridas.

Já dizia Jean Piaget, o principal objetivo da educação é criar pessoas capazes de fazer coisas novas e não simplesmente repetir o que outras gerações fizeram

A capacidade de pensar e de se autodeterminar é o melhor presente educativo que hoje podemos oferecer às nossas crianças, adultos de amanhã.

Honestamente, já pensaram seriamente sobre isto?

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05
Out21

CRESCER JUNTOS

Educação

Educar é uma tarefa que se tem tornado cada vez mais desafiadora. Vivemos um tempo em que aquilo que aprendemos com os nossos pais já não funciona com os nossos filhos. Hoje as crianças são educadas pela família, mas também pela tecnologia a que têm acesso e pelas redes sociais a que continuamente se ligam. Parece que os pais e os professores perderam autoridade e a capacidade de influenciar os seus próprios filhos ou alunos, somente porque são pais ou professores, e que cada vez mais, se torna necessário (e imperioso) reconquistar a atenção, o envolvimento e o respeito dos mais novos.

Cada criança é única e, à sua maneira, especial. As crianças são diferentes e necessitam duma educação ajustada às suas características singulares. Sabemos pela nossa prática diária que o que resulta com um filho ou com um aluno pode não resultar com o outro. Mas também sabemos que apesar desta individualidade, para prosperar e se ser bem-sucedido, todos necessitam igualmente, por parte dos pais, dos educadores ou dos adultos de referência, de uma atitude afetuosa e gentil associada à presença de uma disciplina e firmeza na definição das regras.

Já todos assistimos e vivemos situações desafiantes em que, exaustos, colocamos um ponto final num conflito com os miúdos socorrendo-nos do nosso poder mais autoritário, do género “Ou te levantas, ou não vês a tua série.”, “É assim, porque sou teu pai!” ou “Senão te calas, sais da sala”. Pontualmente e de momento, até resulta, mas não nos livramos da repetição de cenas similares.

Contrariamente ao que já foi tentado, deixar as crianças fazerem aquilo que querem da forma que querem, também parece não ser uma boa solução, pois a neurociência alerta-nos para o facto de as crianças ainda não terem desenvolvida a maturidade neurológica para saberem escolher o melhor para elas e sobretudo, para conseguirem gerir de forma racional as suas emoções.

Como ponto de equilíbrio entre o excesso de rigidez e o excesso de permissividade na educação das crianças, surgiu no final do século XX, criada por Jane Nelsen, a abordagem da DISCIPLINA POSITIVA, na qual a empatia, o afeto, o respeito, a compreensão, a responsabilidade, o exemplo e a aprendizagem mútua surgem com fatores estruturantes duma educação mais eficaz e mais conectada.

A proposta é educar simultaneamente com FIRMEZA e GENTILEZA, sem punições, castigos ou recompensas despropositadas. Trata-se de estipular limites (as crianças precisam de limites que lhes deem segurança) e de saber dizer “não” com empatia (as crianças também precisam de se sentir amadas, aceites e respeitadas), para que o seu crescimento emocional e a sua maturação neurológica se desenvolvam de modo saudável e exponencial.

Não se trata de acabar com os castigos ou de deixar os filhos fazerem o que querem. Trata-se de desenvolver a responsabilidade, de oferecer escolhas limitadas e de deixar vivenciar consequências. Somente o facto de dar a possibilidade de escolha à criança, faz com que esta se sinta aceite, compreendida e fortalecida, bem como gera aquela conexão que tantas vezes sentimos perdida.

Sem queremos decidir e orientar tudo à nossa maneira, estaremos a dar espaço e tempo para a criança descobrir quem é, bem como a favorecer o desenvolvimento da sua identidade, responsabilidade, autonomia, cooperação, confiança e autodisciplina. Desta forma estaremos certamente a formar pessoas mais aptas que, futuramente, serão mais capazes de gerir as suas emoções, resolver problemas e decidir o seu destino.

Exemplificando: Quando uma criança quer comer bolachas antes da refeição, o adulto diz que não, mas a criança teima. Perante a insistência, para tentar minorar a vontade, o adulto reforça a regra de não se comer antes das refeições e dá-lhe a escolher entre as frutas que tem em casa. Desta forma, manteve as “regras”, considerou a necessidade da criança, foi flexível e propôs uma solução positiva.

Então vamos lá. A DISCIPLINA POSITIVA baseia-se em 5 PILARES:

  • Ser gentil e firme ao mesmo tempo (dar limites com afeto), encorajando o respeito mútuo através do exemplo do adulto.
  • Ajudar as crianças a sentirem-se importantes e aceites, gerando um sentimento de conexão e de contribuição.
  • Ser eficaz a longo prazo (ao contrário da punição que funciona a curto prazo), porque considera o que a criança pensa e sente, estimulando a aprendizagem da autorresponsabilidade e da autodecisão.
  • Ensinar habilidades de vida estruturantes da formação de um bom caráter, como o respeito, o autocontrolo, a preocupação com o bem-estar dos outros, a capacidade de resolução de problemas, a responsabilidade, a cooperação, a compaixão e a contribuição.
  • Encorajar as crianças a descobrirem as suas próprias capacidades e talentos, e ainda a usarem o seu poder pessoal de forma autónoma e construtiva.

Façamos agora uma reflexão sobre nós mesmos, os adultos. Quando é que nos sentimos mais motivados a agir? Honestamente, quando somos tratados de forma grosseira sentimo-nos estimulados a fazer alguma coisa? Não, pois não? De um modo geral, quando nos sentimos atacados temos a tendência a entrar em modo defensivo e de sobrevivência. Se é assim connosco, é também assim com as nossas crianças. O que nos levará a acreditar que para levarmos as crianças a se comportarem bem, primeiro, precisamos de as fazer sentir mal? Ou, de onde terá vindo a crença de que para aprender, primeiro é preciso sofrer?

Pelo contrário, a emoção positiva abre as portas da curiosidade, da autoconfiança, da aprendizagem e da criatividade. As crianças são apenas crianças. O seu cérebro mais racional e executivo está ainda em desenvolvimento. Precisam da intervenção do adulto para as ajudar a regular o seu vasto mundo emocional e a direcionar o seu comportamento, e não apenas para lhes apontar o dedo para o que está mal. Precisam de quem lhes abra o caminho da solução e que, de forma afetiva e firme, lhes induza uma DISCIPLINA POSITIVA.

Porém, a Disciplina Positiva não é útil apenas para os mais novos. A Disciplina Positiva tem o dom de impactar positivamente a criança que usufrui desta metodologia e também o educador que a aplica. Contudo, não sendo algo que produza efeitos imediatos, os resultados vindouros serão consistentes e recompensadores. Requer tempo, paciência (com a criança e com o adulto também, pois também nós temos os “nossos dias”), persistência e o envolvimento de toda a família na compreensão das peculiaridades da personalidade, gostos e rotinas pessoais, bem como um atento e contínuo fortalecimento dum sentimento de pertença.

A Disciplina Positiva não é permitir que a criança faça de tudo, mas também não é uma receita milagrosa e rápida para birras e teimosias. Compreender e seguir a Disciplina Positiva significa estar disponível para trabalhar diariamente aspetos de inteligência emocional, como o autocontrolo e a empatia, requerendo resiliência e um exercício atento.

Na prática pode não ser fácil, pois também nós temos dias em que estamos mais irritados e com menos paciência, mas é por isso que, mais do que um modo de educar, a Disciplina Positiva é um modo de pais e filhos CRESCEREM JUNTOS.

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28
Ago21

Ser ou não ser o Exemplo, não é a questão

Educação

Quem estiver atento apercebe-se que as crianças de hoje nascem com um outro “software”. Sei … é difícil perceber a ilha quando se está dentro dela. Mas parem um pouco e observem sem pré-julgamento os bebés que nos chegam aos braços. No que são diferentes dos bebés que fomos ou, para os mais velhos, no que são diferentes dos nossos filhos, hoje, já pais também? Algo mudou. Algo, na sua forma de percecionar o mundo está diferente. Os pequenos seres parecem mais atentos, mais percetivos e perspicazes, mais desenvoltos … questiono-me o que diria Piaget sobre o desenvolvimento infantil nos dias de hoje.

Se acrescentarmos a este facto a grande velocidade a que a vida hoje se desenrola, ao elevado nível de estimulação sensorial a que as crianças estão sujeitas desde que nascem e o grande número de solicitações a que os pais têm de responder no seu dia-a-dia, facilmente encontramos o resultado da equação: andamos todos (não só as crianças) hiperativos e desconectados uns dos outros.

E neste ambiente de correria é fácil perceber que aquilo que mais captamos e retemos são as sensações e experiências que vivemos, não as palavras que ouvimos ou até dizemos.

As crianças estão a nascer com uma enorme capacidade percetiva da realidade à sua volta. O cérebro infantil e adolescente, desde o nascimento tem o seu sistema emocional totalmente desenvolvido e consegue, através de linguagem não-verbal dos pais (atitudes, tom de voz, expressão facial, olhares, estado emocional, etc), captar a “mensagem escondida” por trás daquilo que é dito. Até porque o neocórtex, responsável pela sua capacidade cognitiva e executiva, está ainda em desenvolvimento até ao final da adolescência (21 anos). É assim que, a neurociência nos diz que as crianças e jovens seguirão os exemplos dos seus adultos de referência (pais, familiares, tutores, professores, educadores, etc.) e não apenas as suas palavras ou os seus conselhos. Numa sociedade em que direitos e deveres muitas vezes se confundem, é natural que as crianças também se baralhem e acabem por não entender racionalmente e com clareza os princípios, valores e limites que estão na nossa cabeça.

Costumo dizer que, atualmente, ser um educador consciente e positivo é um desafio imenso e complicado, mas será também dos mais gratificantes. Sim, sabemos que ser pai é uma missão para toda a vida e que não é mesmo nada fácil ser um pai do século XXI. Os pais são o principal ponto de referência ou o exemplo com maior influência na vida dos filhos, e atendendo às características das gerações atuais, constatamos que esse impacto e presença se torna cada vez mais determinante. Não está fácil!

Todos já fomos filhos e todos sentimos o impacto que a ação e o exemplo dos nossos pais teve em nós. Também sabemos bem o tempo e o esforço que empregámos para, mais tarde, nos libertarmos de velhas crenças e padrões que já não nos são úteis ou que até nos limitam, e optarmos de forma consciente e deliberada por aquilo que queremos acreditar e viver. Se queremos isso para os nossos filhos? Claro que não.

Ter esta consciência ativa afeta diretamente o modo como exercemos a nossa função educativa, pois estamos cientes de que, como pais e educadores, quando os nossos atos não estão alinhados com as nossas palavras, a linguagem mais forte e mais facilmente captada pelas crianças e jovens, não é a das nossas palavras, mas a do nosso exemplo. Não obstante, tendemos a esquecer-nos deste “pormaior” e acabamos por nos queixar que “Ele não faz nada daquilo que eu digo!” ou “Ela é muito crítica e muitas vezes ainda põe em causa aquilo que digo.”

As crianças já nascem “antenadas”, ou seja, parece que têm antenas que captam as nossas “mensagens escondidas” com extrema facilidade. Podem parecer aparentemente desligadas, mas tomam atenção a tudo o que dizemos e fazemos, e sobretudo, apercebem-se muito bem quando aquilo que dizemos não se encaixa naquilo que fazemos. E quando assim é, junto dos nossos filhos ou alunos, aquilo que dizemos perde muito valor e importância, perdemos credibilidade e poder de influência. E nada é mais inconsequente que um bom conselho acompanhado de um mau exemplo.

Porém e pelo contrário, se existir coerência entre aquilo que se diz e se faz, a mensagem que pretendemos passar chegará ao cérebro emocional e cognitivo da criança ou do jovem de forma integrada e reforçada. Ganharemos o seu respeito e admiração, passaremos a ser a verdadeira referência positiva nas suas escolhas e das suas opções diárias, e consequentemente seremos reais influenciadores da formação da sua personalidade.

Mas não nos enganemos. Se não assumirmos esse lugar de liderança positiva, coerente e influenciadora na educação dos nossos filhos e alunos, alguém ou algo ocupará esse lugar e desempenhará esse papel. A crianças e os jovens não aprendem com quem mais sabe, mas com quem se ligar e conectar melhor com elas! Deverá ser essa a primeira conquista do educador – conseguir captar a atenção da criança através dum EXEMPLO COERENTE E INTEGRADO.

Como educar pelo exemplo?

Cuidar das rotinas diárias, explicando de forma clara e concreta as regras da casa, bem como agindo em conformidade com essas regras – tanto quanto possível, as regras deverão ser as mesmas para toda a família! Por exemplo, se “não há telemóveis em casa a partir da hora do jantar”, esta regra é para ser cumprida por todos. Partir do princípio de que as necessidades do adulto são mais importantes que as necessidades das crianças é começar mal e pode levar a criança a não perceber a diferença entre aquilo que deseja e aquilo que é o melhor para todos lá em casa.

Cuidar da comunicação, certificando-se que o que diz é mesmo entendido pela criança, olhando no olho, cuidando do tom de voz, estando verdadeiramente na presença da criança quando fala com ela, não fazendo ameaças que não poderá cumprir e cumprindo cuidadosamente aquilo que afirma. E sobretudo, lembrando-se que a comunicação não-verbal fala mais do que aquilo que se diz.

Os nossos filhos e alunos não precisam de pais ou professores perfeitos. Até ao último dia, a vida é uma aprendizagem constante. Por isso, permitir-nos errar e admitir esses erros como oportunidades de melhoria perante os nossos filhos/alunos, é essencial para lhes dar o exemplo e lhes ensinar que, na vida, há sempre espaço para falhar, humildemente corrigir ou tentar de novo, pedir desculpa se necessário e crescer com a experiência.

A opção de não educar pelo exemplo não existe. Não ser o exemplo não é a questão. Para o bem ou para o mal será sempre assim. Até porque se não o fizermos ou dissermos, as crianças e jovens vão perceber na mesma o que se passa, e pior, vão perceber o que não dissemos ou fizemos ou deixámos de fazer. Neste caso, apenas podemos escolher entre “ficar melhor ou pior na fotografia”.

As crianças e jovens dos dias de hoje podem não ouvir os nossos conselhos, mas veem de olhos bem abertos os nossos exemplos e precisam mais do que qualquer geração anterior, duma presença efetiva, conectada e coerente dos pais e educadores.

E esse é o grande paradoxo da educação dos dias de hoje – enquanto temos acesso a mais tecnologia e a melhores condições de vida, a vida acelera nas solicitações profissionais e na permanente “falta de tempo”; simultaneamente as crianças necessitam cada vez mais da presença, exemplo e intervenção do adulto para as ajudar na aquisição dum equilíbrio entre emoção e razão que lhes permita um crescimento mais harmonioso e feliz. Não é fácil, mas é possível e sobretudo gratificante.

Dar o exemplo não é a melhor maneira de influenciar os outros – é a única.”

 Albert Schweitzer

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20
Jun21

O futuro das nossas crianças somos nós

Educação Positiva

Vivemos um tempo em que é difícil comunicar com as crianças e jovens. Parece que não ouvem os adultos, que a autoridade se desvaneceu, que não ouvem se não se levantar a voz ou sem se impor a mesma regra inúmeras vezes. A mais pequena rotina diária virou uma guerra. E isto acontece demasiadas vezes em casa. Acontece demasiadas vezes na escola.

Onde estamos a falhar com as nossas crianças e jovens? No que a escola está a falhar no desenvolvimento da curiosidade e do gosto por aprender? No que a família está a falhar na edificação de jovens equilibrados e felizes?

As crianças e os jovens estão a ir buscar os valores, a identidade e os códigos de conduta à internet e entre pares. O adulto tem perdido influência e diminuído a sua força como figura de referência, o que tem comprometido o bem-estar e a natural ligação familiar.

Porquê? Porque cada vez mais a sociedade se organiza de forma a que os adultos vivam na correria das suas exigências profissionais e dos seus afazeres de rotina caseira, relegando o tempo de qualidade com os filhos para segundo plano. Nada que não acontecesse desde sempre ... pensamos nós.

Porém, entre aquilo que as crianças e os jovens de hoje desejam e necessitam e aquilo que nós, adultos, valorizamos e/ou lhes proporcionamos, parece existir um desalinhamento que não permite que as nossas crianças cresçam felizes e motivadas para serem os melhores autores da sua própria história.

Ao questionar alguns jovens sobre o que mais os perturba, invariavelmente me referem, o stress e a ansiedade. Causada por quê, pergunto eu. Sobretudo pelas exigências da escola, dos professores, dos pais … pelos adultos, diria eu. Existem referências que indicam que atualmente 20% dos jovens do mundo ocidentalizado sofre de stress ou de ansiedade. Sem darmos por isso, está a nascer uma nova epidemia, ultimamente agravada pela pandemia. Será que queremos ver e agir, ou vamos continuar a esperar que as crianças e os jovens se resolvam sozinhos e se encaixem nas nossas expectativas?

Neste estado de desnorte é bom ter presente que os adultos somos nós, e que é em nós que a mudança tem de começar. O cérebro da criança ou do jovem ainda se encontra em fase de desenvolvimento (que terminará pelos 20/21 anos, ou para alguns autores ainda mais tarde), nomeadamente naquilo que se refere às suas capacidades cognitivas e executivas. Por isso tantas vezes ouvimos dizer que as crianças são “espelhos” ou “esponjas”. Atualmente, na condição de aceleração digital e de circulação massiva de informação, sem a presença e intervenção cuidadosa e atenta do adulto para ajudar a fazer a ligação entre o cérebro límbico/emocional e o cérebro executivo/racional, as crianças de hoje têm muita dificuldade em lidar com tanta emoção e tanto estímulo ao mesmo tempo (no nosso tempo era bem mais fácil).

Contudo, muitos de nós, frequentemente não têm conhecimento deste facto revelado pela neurociência e, na aceleração e no stress do dia-a-dia, partem do princípio que a criança “entende” tudo aquilo que se lhe diz e da forma como se lhe diz e que o jovem “já devia saber” o quer que seja, alimentando expectativas que as nossas palavras serão suficientes para que tudo corra bem. E às vezes são. Outras vezes não. Imensas vezes nos esquecemos de que as palavras podem convencer, mas são os exemplos que arrastam! E assim vamos esperando e desesperando que os mais novos façam aquilo que dizemos e não aquilo que fazemos …

Por isso, tornou-se demasiado importante que os adultos saibam que quando a criança se sente insegura ou triste sem ter quem a acolha ou com quem falar, ao não conseguir lidar com a sua dor, se sente sozinha, desprotegida e tende a se desconectar de quem é, a desacreditar em si mesma e a se refugiar em comportamentos distrativos ou reativos.

É demasiado importante que os adultos saibam que para se educar alguém, primeiro é preciso terminar a sua própria educação, conhecendo-se a si mesmo, compreendendo e identificando a sua própria infância e o modo como lidou com os desafios de então. Perceber verdadeiramente no que acredita e o que aprendeu a esconder dentro de si – o medo, a raiva, a revolta, a frustração, as expectativas goradas e agora recriadas, que tantas vezes não permitem olhar a criança de uma forma clara, mas sim como uma projeção de si mesmo.

É demasiado importante que os adultos saibam que as crianças de hoje são muito diferentes das crianças do século passado e que, embora tenham chegado sem um “Manual de Instruções”, podemos lê-las à luz duma presença plena, sem pressas, de forma atenta, próxima e curiosa, olhos nos olhos, coração no coração.

É demasiado importante que os adultos se lembrem que comportamento gera comportamento, e que, tal como nós tendemos a repetir padrões de relacionamento dos nossos pais e família, também os nossos filhos tenderão a repetir os nossos padrões. Não obstante e mesmo que aparentemente isso não seja evidente e que a estratégia seja diferente, é importante saber que, em cada família, existe uma “lealdade em cadeia” que une pais e filhos.

Por isso é tão importante que cada educador resgate a sua melhor versão, se transforme num incondicional porto-seguro e cuide da coerência entre aquilo que diz e faz … e que o faça não só por amor, mas com amor, pois tem nas suas mãos e à sua responsabilidade um ser vulnerável que carece, mais do que em qualquer outro momento da história da humanidade, da presença e do amor incondicional dos seus pais para se sentir seguro, aceite, compreendido e amado.

E se o fizermos, depressa perceberemos que aquilo que as crianças desejam é sentirem-se ligadas física e emocionalmente, que os pais as aceitem como são e as escutem, que falem com elas e não só para elas, que lhes seja permitido exprimir a sua autenticidade, sem julgamentos e críticas, que confiem nelas, deixando-as tomar decisões, experimentar, errar e aprender pelos seus próprios pés.

Porquê? Porque nascemos para aprender e aprender é a natureza humana. Instintivamente, as crianças querem aprender, querem crescer, querem viver sem medo, querem ser incentivadas e valorizadas … e quando os pais não “têm tempo”, elas irão procurar orientação e validação noutro lugar. E a internet está à mão, as conexões com os seus pares estão digitalmente acessíveis, os jogos e as séries anestesiam o vazio que sentem … E é assim que, sem se dar por isso, o ponto de referência muda. E quando acordamos já existe muito caminho percorrido (ou não percorrido) e o distanciamento está instalado.

Nós somos os adultos! É em nós que a mudança começa. Não podemos esperar que as crianças mudem se nós não nos disponibilizarmos primeiro a conhecer-nos, compreender-nos, aceitar-nos e a amar-nos o suficiente para nos tornarmos conscientes do que verdadeiramente se passa com as nossas crianças e jovens.

O futuro das nossas crianças somos nós!

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15
Mai21

Porque não conseguimos impor regras aos nossos filhos?

As crianças de hoje parecem não nos ouvir …

Porque é tão difícil levar as crianças ou jovens a fazer aquilo que nos parece ser o certo e o melhor para eles? Porque ultimamente tem sido tão difícil disciplinar rotinas diárias e implementar regras com as crianças e jovens?

Parece que só fazem aquilo que querem, que nos desgastam “porque sim” e que no final, nos vencem pela exaustão …

Talvez seja por não entenderem verdadeiramente aquilo que nós estamos ou queremos dizer. Porquê? Porque nós não explicamos de modo que elas entendam e sobre tudo, de modo, a que elas se sintam escutadas e acolhidas.

“Mas eu combino as regras com o meu filho e, mesmo assim, ele depois não as cumpre!”

Paremos para pensar. Afinal o que é o nosso “combinar”?

Muitas vezes o adulto expressa e afirma o que quer, ouve de soslaio o que a criança diz, e no final remata: “Combinado?”

Será mesmo uma “combinação” ou um acordo entre partes? Parece-me que nestes casos, e apesar do uso da palavra “combinado”, não se trata de uma combinação ou de um acordo, mas de uma imposição bem camuflada num suposto “combinado”.

Outras vezes o adulto não confia que a criança vai conseguir cumprir o que ficou definido e demonstra isso com frases do tipo: “Sempre quero ver se desta vez vai ser diferente do costume e se fazes aquilo que combinámos”…

Ou, quase em desespero, usa chantagens para que aquilo que foi “combinado” seja cumprido: “Se tomares banho por tua iniciativa, deixo-te ficar mais tempo a jogar.”

Este tipo de situação pode ser confundida com negociação, mas na verdade é uma chantagem. Quando o adulto propõe uma compensação, a criança tende a não cumprir o seu compromisso de uma forma consistente, uma vez que o “negócio” só fez sentido para ganhar algo em troca. Esta opção resolve a situação no momento, mas mais tarde revela um curto prazo de validade.

E pode ainda acontecer que, no caso de a criança não cumprir o “combinado”, o adulto castigue a criança: ”Não cumpriste o que combinámos, por isso vais ficar uma semana sem tablet”. É neste momento que a criança interioriza que o adulto deixou de acreditar nela – “end of history!”.

Está cientificamente comprovado que o cérebro da criança, embora nasça emocionalmente desenvolvido, racional e cognitivamente estará em desenvolvimento até cerca dos 20 anos! Por essa razão, pesquisas neurocientíficas demonstram que as crianças até aos 12 anos não respondem à punição e aos castigos com aprendizagens concretas, mas pelo contrário sentem-se injustiçadas e incompreendidas, desenvolvendo apenas comportamentos mais ou menos condicionados e adaptados.

Afinal, será que temos assim a memória tão curta? Como foi quando éramos crianças? Eu lembro-me de sentir dentro de mim uma incompreensão e uma revolta profunda, pois não conseguia entender o que se passava à minha volta nem o porquê das limitações e condições que me impunham. E convosco, como foi?

Ok, então vamos lá. Como podemos fazer diferente? Como poderemos conseguir estabelecer uma verdadeira e eficaz comunicação com os nossos filhos? Como poderemos trazer mais paz e harmonia à vida familiar?

Vamos lá trazer um pouco mais de clareza à questão …

Uma REGRA é um princípio ou uma norma FIXA e que se aplica a TODOS! São as regras da casa. E não funcionam bem se forem as regras de uns e não de outros, por mais óbvias e racionais que nos pareçam as nossas justificações.

Para a regra funcionar tem de ser genuinamente aceite por todos os envolvidos, independentemente da sua idade e papel que desenvolve no sistema. E para tal, é importante que na regra fixa, para além da sua parte inegociável, exista uma outra parte que seja flexível e passível de ser “personalizada” e incorporada como “minha”.

Como é que isso se faz? Através de acordos e combinações, onde fica COMBINADO o “modo COMO” essa REGRA vai ser cumprida por todos.

Um ACORDO (ou combinado) é algo que é negociável e flexível, que deve ser honesta e claramente especificado no pacto que se estabelece com a criança, sendo as suas ideias e propostas necessária e atentamente consideradas na resolução final.

Não nos iludamos, as crianças percebem bem demais os nossos “sim para que me deixes”!

E quando assim é, a nossa expectativa de ter filhos obedientes e pouco adversos … contradiz o nosso desejo de criar pessoas ativas, interventivas e empreendedoras da sua própria felicidade e sucesso. Se queremos que eles aprendam a pescar, não lhe podemos dar o peixe já pronto!

As crianças aprendem mais pelo nosso exemplo do que pelas nossas palavras, por isso a solução passa mais pelo nosso alinhamento entre razão e ação, do que pela nossa explicação o imposição.

A arte de impor uma regra está afinal … em não a impor!

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Glossário:

ACORDO – Pacto resultante da comunhão de ideias e sentimentos. Concordância e harmonia. Requer uma abertura à mudança, flexibilidade e conciliação. Através da aceitação e da escuta de ambas as partes, leva à descoberta de novos pontos de vista, congruentes e com ganhos para ambos os lados.

CHANTAGEM – não é um ato educativo nem reforça um novo comportamento positivo e desejado porque não gera uma adesão voluntária, uma reflexão ou um compromisso pessoal.

IMPOSIÇÃO – é uma repressão que muito prejudica a relação, pois a criança entende que não pode expressar ou realizar o que pensa, sente ou quer … com todas as consequências que hoje sentimos na nossa própria pele.

PUNIÇÃO ou CASTIGO – produz a diminuição do comportamento indesejado de imediato, reduz a probabilidade da sua repetição … mas não resolve a questão. Aumenta a revolta e a tendência para a afronta, pois a criança não compreende a ligação ou a razão por que está a ser castigada. Crianças até aos 12 anos não respondem ao castigo com a aprendizagem que os adultos desejam … apenas se adaptam e sobrevivem.

CONSEQUÊNCIA - é o resultado de algo produzido por uma causa (relação causa-efeito). Deixar que as crianças vivenciem as consequências dos seus atos ou da falta deles, permite que se apercebam da real importância das suas ações e da relação causa-efeito que estabelecem.

 

FONTE: Instituto de Coaching Infanto-Juvenil, Método Core Kidcoaching